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Psicólogos como Coaches e Orientadores Profissionais: conquistando nossos campos de atuação

Texto por Romano Zattoni, Rafaela de Faria, Barbara Zerbatto, Ligia Rosenstein e Paulo Borges.

Olá colegas,

Há algum tempo que nossa equipe do Instituto de Carreira e Orientação Profissional (ICOP) atua na área de planejamento e desenvolvimento de carreira. Além dos desafios tradicionais deste serviço, a cada dia surgem novos obstáculos que exigem um posicionamento crítico sobre o presente e futuro de nossas concepções teóricas e práticas. Portanto, cremos que é importante iniciar diálogos e debates com relação a novos temas que vem entrando em pauta nesta área de atuação, e este breve artigo surge para expor algumas de nossas reflexões e também para lançar certos questionamentos.

Gostaríamos de começar fazendo referência ao subtítulo do artigo: ‘conquistandonossos campos de atuação’. Aqui é importante salientar que não utilizamos o verbo ‘defender’, o que já faz parte do teor das reflexões que gostaríamos de trazer, que se referem, sobretudo à formação e capacitação profissional do psicólogo. Para isso começaremos falando sobre a Orientação Profissional (OP).

 

 

A procura pela OP tem aumentado nos últimos anos, sendo um dos fatores mais proeminentes para essa procura é o fato de estarmos presenciando um dos auges de uma das frases mais características da chamada geração: “eu quero trabalhar no que gosto”. Portanto, na medida em que essa demanda se estabelece no mercado, surge a necessidade de profissionais qualificados para atender este público, no entanto, a nosso ver, a necessidade de formação nesta área não tem recebido a devida atenção.

Um dos pontos que gostaríamos de ressaltar é a pouca representação que a OP possui nos principais cursos de graduação em Psicologia do Paraná. Ao trazer este tipo de crítica, não queremos afirmar que o psicólogo deveria idealmente sair da graduação absolutamente apto a atuar no mercado de trabalho, pois esta não é evidentemente a proposta da maioria dos cursos que assumem uma abordagem de formação generalista. Para nós, a importância jaz em adquirir conhecimento sobre este campo de atuação de maneira sólida, desde as mais básicas compreensões de nomenclatura como a diferença entre ‘testes vocacional’ e ‘orientação profissional, até as relações deste campo com outros mais “tradicionais” como, por exemplo, a psicologia organizacional e a avaliação psicológica.

Com relação à capacitação, temos outros tipos de questões. Sabemos que a exigência por parte do CRP de especializações formais para permitir a atuação em certos campos de atuação é um assunto delicado e que possui implicações nas mais diversas áreas, e que no caso da OP há ainda a questão de não se tratar de uma atividade exclusiva do psicólogo. No entanto, em nossa concepção é importante salientar que tão importante quanto um diploma é a possibilidade do profissional de olhar para si mesmo e questionar se a capacitação que possui para atuar é suficiente e se com isso está apto a realizar um serviço com qualidade e competência. É interessante que essa capacidade de autocrítica está diretamente relacionada com a questão da formação anteriormente mencionada, pois o profissional só vai poder avaliar se está adequadamente apto a atuar se ele possuir uma noção real daquilo que consiste o campo de atuação.

Outro campo de atuação que exemplifica ainda melhor algumas das questões sobre a inserção do psicólogo em campos multidisciplinares é o Coaching. Quando compreendido de forma abrangente como um processo de desenvolvimento de competências, o coaching se mostra um campo amplamente multidisciplinar, com profissionais das mais variadas áreas realizando este tipo de atividade. No entanto, quando as competências a serem desenvolvidas possuem um caráter psicológico, como no caso do coaching de liderança, observamos certa predominância de profissionais oriundos da administração de empresas e da psicologia.

Frente a este tipo de cenário, não cremos que a abordagem mais eficiente seja a de reivindicar uma exclusividade do psicólogo no que se refere à atuação como coach, pois em nossa visão este tipo de movimento, de forma geral, não visa a valorização das possibilidades da psicologia neste tipo de atuação, mas sim a desqualificação de outras formações, o que gera debates que não necessariamente vêm para benefício da profissão.

A questão que para nós é fundamental é: que tipo de diferencial possui o psicólogo no campo de atuação do coaching? Ou, que aspectos de nossa formação nos tornam especialmente adequados para este tipo de trabalho? As respostas a essas perguntas são muitas, dentre elas destacamos a sensibilidade do profissional de psicologia em identificar e lidar com o sofrimento psíquico e a capacidade de questionar a presença desse em situações nas quais ele não é imediatamente evidente, muito comuns nos processos de coaching, onde por vezes uma demanda com relação a uma competência ou objetivo específico pode “mascarar” a presença de um sofrimento psíquico de caráter mais abrangente.

Esse tipo de discernimento, que remete à questão da diferença entre psicoterapia, OP e coaching, é uma questão amplamente debatida e de difícil conclusão, sobretudo com relação à definição de fronteiras entre uma prática e outra. Portanto, percebemos que a reflexão crítica nestes casos é necessária e o psicólogo é em geral especialmente a poder levar a cabo este tipo de diferenciação.

Vemos então, retornando ao subtítulo do artigo, que a tarefa do psicólogo nestes casos não melhor descrita como uma ‘defesa’ de campos de atuação, pois isso implicaria que já há algo conquistado que está sob risco de ser tomado por alguém. Acreditamos que, sobretudo no caso do coaching, este espaço ainda não foi ‘conquistado’, o que se coloca como tarefa e de quebra justifica nossa escolha para o nome desse artigo.

Mas se a psicologia oferece tamanhos recursos para a atuação de seus profissionais nestes campos de atuação, qual é então o entrave que é encontrado para a conquista deste espaço? Depois de extensas discussões em nosso instituto concordamos que um grande fator é: a ausência de uma cultura de assertividade com relação ao mercado de trabalho. Em outras palavras, a dificuldade em se colocar em posições de visibilidade no mercado.

Desnecessário dizer que esse tipo de postura frente ao mercado de trabalho é diversas vezes vista com maus olhos, ou minimamente com receio dentre a comunidade de psicólogos, no entanto, a insegurança em adentrar este tipo de ‘mundo’ do mercado é algo que tem implicações diretas na forma como a psicologia é vista e valorizada socialmente.

Percebemos que dentre os maiores entraves encontra-se a dificuldade de se conciliar a questão da ética em psicologia com uma postura assertiva no mercado de trabalho. Sem dúvidas, boa parte das práticas de divulgação, captação de clientes, venda, dentre outras atitudes de mercado ferem os princípios éticos que norteiam nossa profissão, porém, negligenciar a forma como a realização ética destas ações pode ajudar a psicologia a conquistar espaço em atuações multidisciplinares seria uma atitude prejudicialmente generalizante e que revela uma não reflexão acerca das verdadeiras implicações da ética na prática do psicólogo.

Vemos nesse desafio de se colocar competitivamente no mercado de trabalho mais uma oportunidade do psicólogo mostrar seu diferencial frente a sociedade, conseguindo isso ao poder abordar o mercado de forma assertiva, não deixando de realizar as práticas necessárias para tal, mas efetivando isso de forma honesta e ética, respeitando a possibilidade de escolha do indivíduo que é um dos mais belos princípios de nossa profissão.

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